quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Aquele cotidiano

Todo dia ele fazia tudo sempre igual. Acordava às sete da manhã não porque precisasse, mas porquê ele queria, fazia uma pequena rotina de exercícios de yoga, tomava banho, secava seus cabelos, vestia sua roupa, arrumava suas coisas e tomava seu café com leite e comia torradas com manteiga enquanto assistia o jornal.

Entre a internet e a TV, fumava um cigarro e tomava mais café. Colocava sua carteira no bolso, pendurava sua mochila nas costas, pegava suas chaves e saia de casa rumo ao trabalho, andava alguns bons metros até o metrô, descia e pegava um ônibus. Descia um ponto antes do ponto mais próximo ao trabalho para poder fumar um cigarro antes de entrar.

Chegava ao trabalho, ligava seu computador recebia os up-dates de tudo, descia tomava uma xícara de café preto e trabalhava, trabalhava e trabalhava. Saía correndo do trabalho no final da tarde andava até o ponto de ônibus e pegava um, até a faculdade.

Descia três quarteirões antes, pois ali era o ponto mais próximo de sua escola, no caminho fumava mais um cigarro, às vezes encontrava alguém pelo caminho com quem ia conversando. Mas na maioria das vezes descia sozinho a rua.
Chegando à faculdade passava antes pelo banheiro, lavava o rosto e as mãos, ia até o bebedouro enchia sua garrafa d’água e seguia pra mesa de sempre na cafeteria onde seus amigos estavam. Conversava sobre tudo, banalidades, piadas, trabalhos.

No final das aulas corria para o ponto de ônibus e dali pra frente estava só de novo, corria pra chegar em casa, para descansar porque no dia seguinte sabia que faria tudo isso de novo.

E assim dias foram transformando-se em semanas e as semanas se fizeram meses, mas em um desses dias no caminho entre o banheiro e o bebedouro da faculdade ele cruzou com seus olhos azuis, pele branca, cabelos dourados e seus lábios rosados. Sentiu algo por dentro que não sabia dizer exatamente o que era, era como um lento-arrastar-de-asas pelo seu rosto, era uma antecipação de algo que ele não previa acontecer, sentia uma violenta pressa em correr todos os dias para que chegasse a hora de se encontrarem novamente, sentia que nada faria sentido dali pra frente. Sabia que daquele dia em diante tudo estava perdido.
(TORG)

terça-feira, 2 de novembro de 2010

"A gota que falta"

Em pé na lavanderia em sua casa enquanto passava sua camisa para ir trabalhar no dia seguinte, pensava em todas as coisas que haviam acontecido nos últimos meses, coisas que eram boas e outras não tão boas assim, pensava que a vida era assim mesmo, pois sabia que quando não se consegue mudar "certas" coisas é melhor se conformar e torcer pra que outras coisas melhorem de outra forma. Tinha tanta convicção de que ia tudo ser diferente, mas no fundo no fundo tinha poucas esperanças de que as mudanças realmente seriam boas. “... Não se afobe não que nada é pra já...”

E olhando em volta estava sozinho mais uma vez, apenas aquele velho CD da Ro ro tocando ao fundo, iluminado pela aquele velho abajur de luz amarelada onde a fumaça do cigarro se misturava ao vapor do ferro, formando um balé de cores e nuances. Silhuetas subindo perdidas e se achatando ao teto. “... A eterna desventura de viver...”.

Queria que não sentisse tanta raiva da eterna impotência humana perante algumas coisas da vida, mas era tão humano sentir raiva, e sentir-se só e nada podia fazer se não, apenas continuar passando sua camisa e apreciando a mistura de vapor e fumaça de seu cigarro subindo solta e se achatando ao teto. “... Milênios no ar...”